Tradução de Jaa Torrano (FFLCH-USP)
EURÍPIDES – As Bacas
ARGUMENTO DE AS BACAS
Os parentes de Dioniso em Tebas negavam que fosse um Deus. Ele lhes impôs a punição conveniente: enlouqueceu as mulheres tebanas e conduzindo seus tíasos as filhas de Cadmo foram para o Citéron. Cadmo já velho, Penteu, filho de Agave, assumindo a realeza, afligia-se com os acontecimentos, prendeu as bacas capturadas e enviou outros contra o Deus mesmo. Eles o dominaram sem resistência e conduziram a Penteu. Este os ordenou prendê-lo e guardá-lo no palácio, não somente dizendo que Dioniso não é Deus, mas ainda ousando tratá-lo em tudo como a um homem. Este com terremoto arruinou o palácio e conduzindo ao Citéron, persuadiu Penteu a espionar as bacas, com vestes de mulher. Elas o dilaceraram, comandadas pela mãe Agave. Cadmo, ao saber do fato, recolheu os membros dilacerados e por fim avistou a cabeça nas mãos da mãe. Dioniso manifesto dirigiu-se a todos e a cada esclareceu o que lhe aconteceria, a fim de que forasteiros não o desprezassem como homem nem por atos nem por palavras.
ARGUMENTO DO GRAMÁTICO ARISTÓFANES
Dioniso, quando se tornou Deus, porque Penteu não queria adotar seus rituais, enlouqueceu as irmãs de sua mãe e obrigou-as a dilacerar Penteu. O tratamento do mito consta em Ésquilo em Penteu.
Drama representado após a morte de Eurípides, ocorrida em 407/406.
[PRÓLOGO (1-63)]
DIONISO:
Venho a esta terra tebana, filho de Zeus,
Dioniso, que nasceu da filha de Cadmo,
Sêmele, partejada por relampejado fogo.
Mudada a forma de Deus na de mortal,
estou no fluxo de Dirce e no rio Ismeno. 5
Vejo este monumento à mãe fulminada
perto do palácio e ainda ruínas da casa
fumegar chama viva do fogo de Zeus,
imortal agressão de Hera à minha mãe.
Louvo Cadmo, que interditou este solo, 10
santuário da filha. Eu o cobri ao redor
todo com o cacheado verdor de videira.
Deixei os auríferos territórios dos lídios
e frígios, percorri ensolarado chão pérsio,
muralhas báctrias e a intempestiva terra 15
de medos, Arábia de bom Nume e toda
a Ásia que está à beira do salgado mar
com as belas fortificadas urbes repletas
de gregos e bárbaros misturados juntos,
e vim a esta primeira urbe entre gregos, 20
lá fiz coros e instituí os mistérios meus,
para manifestar-me Nume aos mortais.
Aqui primeiro em Tebas em terra grega
alarideei depois de atar a pele de corça
e empunhar o tirso, a hederígera lança. 25
Quando irmãs da mãe, quem não devia,
disseram Dioniso não nascido de Zeus,
e Sêmele feita mulher por um mortal
atribuir a Zeus esse desacerto do leito,
sofismas de Cadmo, e por esse alarde 30
Zeus tê-la matado por mentir núpcias.
Por isso de suas casas eu as aguilhoei
loucas e vivem no monte perturbadas,
e obriguei a ter vestes de meus ritos.
E enlouqueci toda a feminina semente 35
de cadmeias, todas elas, fora de casa;
sentam-se junto com filhas de Cadmo
sob verdes abetos em pedras sem teto.
Esta urbe deve aprender, sem querer,
que não se iniciou em meus delírios, 40
e minha mãe Sêmele devo defender
claro aos mortais Nume nato de Zeus.
Cadmo outorga o privilégio e poder
a Penteu, porque nascido de sua filha,
ele combate Deus em mim e repele-me 45
de libações e não menciona em preces.
Por isso, Deus nato me mostrarei a ele
e aos tebanos todos. Bem situado aqui,
manifesto, moverei o pé em mudança
para outra terra. Se a urbe dos tebanos 50
com armas irada tentar tirar as Bacas
do monte, atacarei chefiando as loucas.
Por isso tenho outro aspecto de mortal
e mudei a minha forma em ser humano.
Ó vós, vindas de Tmolo, fortaleza lídia, 55
ó tíaso meu, mulheres que dos bárbaros
trouxe parceiras de pouso e de percurso!
Erguei os tamborins regionais da urbe
frígia, invenção de mãe Reia e minha,
circundai este palácio real de Penteu 60
e estrepitai para a urbe de Cadmo ver.
Eu com as Bacas ao vale do Citéron
irei onde estão e participarei dos coros.
[PÁRODO (64-169)]
CORO:
Em ásia terra longe
deixei o sacro Tmolo e danço 65
doce esforço por Brômio,
fácil fadiga, com evoé
evocando Báquio.
Ó da rua! Ó da rua!
Ó de casa, vinde fora!
Todos consagrem silente boca! 70
Hinearei os costumeiros
sempre a Dioniso.
Feliz quem de bom Nume EST. 1
viu mistérios de Deuses,
mundifica a sua vida,
põe a alma no tíaso, 75
bacante nos montes
em depurações lícitas
tendo por lei os ritos
de grande mãe Cíbele
brande alto o tirso 80
e coroado de heras
é cultor de Dioniso.
Vinde, Bacas, vinde, Bacas,
Brômio Deus filho de Deus
Dioniso trazei dos montes 85
frígios às amplas ruas
da Grécia, o Brômio!
Quando o gestava ainda ANT. 1
no parto coato de dores
por voar trovão de Zeus 90
a mãe pariu do ventre
fruto ao deixar a vida
com fulminante golpe,
já o recebeu na câmara
do parto Zeus Crônida, 95
e recoberto na coxa
costura-o com alfinetes
áureos oculto de Hera.
Partes se cumprindo
pariu tauricórnio Deus 100
e coroou-se de serpentes
daí loucas pôr nas tranças
preia nutriz de fera.
Tebas nutriz de Sêmele, EST. 2
coroai-vos de heras, 106
brotai, brotai verdes
briônias de belas bagas,
debacai-vos com ramos
de carvalho ou de abeto 110
e vestes de corça pedrês,
coroai-vos com lã de alvas
tranças, consagrai soberbas
férulas, dançará toda a terra,
quando Brômio guiar o tíaso 115
ao monte, ao monte, onde
feminina turba espera
longe de rocas e teares
aguilhoada por Dioniso.
Ó recanto de Curetes, ANT. 2
divinas grutas de Creta 121
criadoras de Zeus onde
os Coribantes trielmados
nas furnas me inventaram
este redondo tenso tambor 125
e na baqueia intensa com
doce grito de flautas frígias
puseram na mão de mãe Reia,
fragor aos evoés de Bacas,
enlouquecendo-se os Sátiros 130
conseguiram da Deusa mãe
e nas festas bienais
enlaçaram aos coros
com que se praz Dioniso.
Doce é nos montes quando EPODO
de tíasos velozes cai no chão 136
com a sacra veste de corça
caçando o sangue
caprino, crudívora graça,
solto nos montes frígios, lídios, 140
este regente Brômio,
evoé!
Flui leite no chão, flui vinho,
flui néctar de abelhas.
Qual fumo de incenso sírio
o Baqueu ergue ígnea 145
chama de pinho
e salta com a férula
nas corridas e nos coros,
errante, provocante,
vibrando altos brados,
lançando ao céu luxuosa trança. 150
E com evoés ressoa assim:
vinde, ó Bacas,
vinde, ó Bacas,
luxo de aurífluo Tmolo,
celebrai o Dioniso, 155
sob tonítruos tambores,
com évio júbilo do évio Deus,
com gritos e vozes frígios,
quando ressoa sonora flauta 160
sacra sacros jogos consoantes
nos passeios no monte, no monte.
Qual feliz potra com a mãe no pasto, 165
move o pé veloz aos saltos – Baca!
[PRIMEIRO EPISÓDIO (170-368)]
TIRÉSIAS:
Ó da porta! Chama lá da casa Cadmo, 170
filho de Agenor, que deixou a sidônia
urbe e edificou esta cidade dos tebanos.
Vá lá alguém, anuncia que Tirésias o
procura; ele sabe por que razão venho,
que combinei, velho com mais velho, 175
acender os tirsos, vestir pele de corça
e coroar a cabeça com ramos de hera.
CADMO:
Ó caríssimo, ao perceber ouvir tua voz
sábia de sábio varão, ao estar em casa,
venho, pronto com esta veste do Deus. 180
Devo, porque é filho de minha filha
Dioniso que surge Deus aos homens,
magnificar tanto quanto for possível.
Onde devo dançar? Onde pôr o pé
e sacudir cabeça grisalha? Diz-me tu, 185
ao velho, ó velho Tirésias! Tu és sábio.
Não me cansaria à noite nem de dia
bater o tirso na terra com doce oblívio
de velhice.
TIRÉSIAS:
Sentes o mesmo que eu!
Também sou jovem e farei a dança. 190
CADMO:
Não iremos nós de carro ao monte?
TIRÉSIAS:
Mas o Deus não teria igual honra.
CADMO:
Eu sou o preceptor velho do velho.
TIRÉSIAS:
O Deus nos conduzirá fácil para lá.
CADMO:
Só nós da urbe dançaremos a Báquio? 195
TIRÉSIAS:
Só nós bem pensamos; os outros, mal.
CADMO:
Muito tarda! Segura em minha mão!
TIRÉSIAS:
Olha, junta e faz uma parelha a mão.
CADMO:
Mortal nato não desdenho os Deuses.
TIRÉSIAS:
Não fazemos sofismas com Numes. 200
Pátrias tradições que temos coevas
do tempo, nenhuma razão rejeitará,
nem se a suma sapiência se revelar.
CADMO:
Dirão que não respeito a velhice,
indo dançar com heras na cabeça? 205
TIRÉSIAS:
O Deus não distingue nem jovem,
nem velho, se é necessário o coro,
mas de todos quer ter as honrarias
comuns; sem número quer louvor.
CADMO:
Tirésias, porque não vês esta luz, 210
serei o teu intérprete por palavras.
Penteu aqui vem rápido para casa,
filho de Equíon, a quem dei poder.
Tão perturbado, que novidade dirá?
PENTEU:
Estava em viagem fora desta terra 215
e ouço novidades desta urbe más:
mulheres nos abandonarem casas
em falsas baqueias, nos frondosos
montes dançarem, novato Nume
Dioniso, que seja, sendo honrado 220
nos coros, crateras cheias no meio
dos tíasos e cada uma por sua vez
escondida servir leitos de machos,
sob o pretexto de loucas sagradas
irem a Afrodite antes de a Báquio. 225
Quantas prendi, servos conservam
atadas pelas mãos em prisão pública;
quantas faltam, caçarei nos montes,
Ino, Agave, que me gerou a Equíon,
e a mãe de Actéon, digo Autónoe, 230
e se as encerro em malhas de ferro
cessarei esta maléfica baqueia logo.
Dizem que um forasteiro imigrou,
feiticeiro encantador da terra lídia,
de olente cabeleira de loiros cachos, 235
víneo, visando graças de Afrodite,
ele durante dias e noites convive
com as jovens alegando ritos évios.
Se o capturar dentro do território,
cessarei estrépito de tirso e abalo 240
de cabeleira, quando o decapitar.
Ele declara que Dioniso é Deus,
ele diz costurado na coxa de Zeus
quem abrasou nas luzes dos raios
com a mãe, por falso leito de Zeus. 245
Isto não é terrível e digno de forca,
transgredir tanto quem é forasteiro?
Mas eis outro milagre: vejo o vate
Tirésias em pele de corça malhada,
e o pai de minha mãe, muito ridículo, 250
ser Baco com férula! Renego, ó pai,
ver que vossa velhice não tem tino.
Não rejeitarás a hera? A mão livre
não soltarás do tirso, ó pai da mãe?
Tu o persuadiste, Tirésias! Queres 255
com esse Nume novo aos homens
sondar auspícios e lucrar das piras.
Se velhice grisalha não te valesse,
tu te sentarias preso entre as Bacas
por trazer ritos danosos. Onde há 260
o brilho de uva na ceia de mulheres,
não digo mais nada são nos rituais.
CORO:
Ímpio, ó estranho, não temes os Deuses
nem Cadmo semeador do fruto terrígeno,
mas sendo filho de Equíon vexas a casa? 265
TIRÉSIAS:
Quando hábil varão tem bons motivos
para falar, não custa muito falar bem.
Tens bem fluente língua qual prudente,
mas não há prudência em tuas palavras.
Varão capaz de audácia e hábil orador 270
torna-se mau cidadão, se não tem tino.
Este Nume novo, que tu ridicularizas,
eu não poderia dizer quanta grandeza
terá na Grécia. Ó jovem, dois princípios
há entre os homens: a Deusa Deméter, 275
ela é Terra, dá-lhe um dos dois nomes,
ela com alimentos sólidos nutre mortais,
ele veio depois, êmulo filho de Sêmele,
da vinha inventou líquida poção e deu
aos mortais, ele tira os míseros mortais 280
da dor, quando cheios do fluxo da vinha,
dá sono e oblívio dos males de cada dia,
e não há outro remédio contra os males.
Ele, Deus nato, é a libação dos Deuses,
tal que os homens têm por ele os bens. 285
Ris dele porque foi costurado na coxa
de Zeus? Dir-te-ei como é bem assim.
Quando Zeus o tirou do fulmíneo fogo,
e transportou o novo rebento ao Olimpo,
Hera queria arremessá-lo fora do céu, 290
Zeus por sua vez tramou tal qual Deus:
quebrou fragmento do céu circuntérreo,
e deu refém a Hera, afastando Dioniso
do rancor dela. Os mortais com o tempo
dizem-no costurado no fêmur de Zeus, 295
trocando nome, pois o Deus da Deusa
Hera foi refém, e compuseram o conto.
Este Nume é divinatório, pois o báquico
e o louco têm muita ciência divinatória.
Quando o Deus vem muito a cada um, 300
faz os enlouquecidos dizerem o futuro.
Ele tem alguma participação em Ares;
estando a tropa em armas e em ordem,
o pavor aturdiu, antes de tocar a lança;
é loucura, e isso é da parte de Dioniso. 305
Ainda o verás até nas pedras de Delfos
saltar com tochas o chão de dois cimos,
verás brandir e sacudir o báquico ramo,
e ser grande na Grécia. Penteu, ouve-me:
não digas que o poder pode em homens, 310
mas se crês nisso e a crença te perturba,
não te creias bem! Acolhe Deus na terra,
faz libação, sê Baco e coroa tua cabeça!
Não Dioniso obriga as mulheres serem
prudentes com Cípris, mas por natureza 315
a prudência sempre é presente em tudo.
Observarás isto: ainda que em baqueias,
se ela for prudente, não se corromperá.
Vês? Tu te alegras, se há muitos de pé
às portas e a urbe faz o louvor a Penteu; 320
também ele, creio, se compraz de honras.
Eu, pois, e Cadmo, de quem escarneces,
faremos coroas de hera e faremos coros,
grisalha parelha, mas dançar é preciso!
Persuadido por ti não combaterei Deus. 325
Enlouqueces como dói mais, não terias
cura com drogas nem sem elas adoeces. [MANUSCRITOS LP]
CORO:
Ó velho, não vexas Febo nas palavras.
Prudente, honras Brômio, grande Deus.
CADMO:
Ó filho, bem te aconselhou Tirésias. 330
Vive conosco, não vás fora das leis!
Agora voas, e pensando não pensas.
Ainda que não seja Deus, como dizes,
por ti seja dito, e por bem mente tu
que é de Sêmele, que a creiam parir 335
Deus e honrem toda a nossa família.
Constata a mísera morte de Actéon,
que as crudívoras cadelas que criou
dilaceraram, por alardear ser melhor
que Ártemis nas caçadas nos bosques. 340
Não o sofras tu! Vem, eu te coroarei
com heras e honra conosco ao Deus!
PENTEU:
Não me ponhas a mão! Vai, sê Baco,
mas não me transmitas tua estultícia!
A esse instrutor da tua insensatez, 345
farei justiça. Apresse-se um de vós,
vai ao trono onde ele sonda auspícios
com tríplice forcado e revira ao revés
e reverte tudo aquilo e mistura junto
e solta coroas aos ventos e procelas! 350
Maior darei a mordida, se fizer isso.
Percorrei outros a urbe e investigai
efeminado forasteiro que traz nova
doença às mulheres e polui os leitos.
Se o capturardes, trazei-o preso cá 355
para que morra com justiça lapidar
e veja amargas baqueias em Tebas.
TIRÉSIAS:
Ó mísero! Não sabes o que dizes.
Já estás louco, antes estavas tonto!
Vamos, Cadmo! Supliquemos nós 360
por ele, ainda que ele seja selvagem,
e pela urbe, que o Deus não faça algo
novo. Segue-me com bastão de heras,
tenta reerguer meu corpo, e eu o teu!
É feio os dois velhos caírem. Vamos! 365
É mister servir Báquio, filho de Zeus.
Que para tua casa Penteu não importe
dor, ó Cadmo! Não o digo por prever
mas por fatos, pois o tolo diz tolices.
[PRIMEIRO ESTÁSIMO (370-431)]
CORO:
Licitude, Dona Deusa, EST. 1
Licitude, que na terra 371
vagas com áureas asas,
ouves isso de Penteu?
Ouves essa não lícita
agressão a Brômio 375
de Sêmele, Nume
nos coroados prazeres
primeiro dos Venturosos?
Ele faz tíaso dos coros,
provoca riso na flauta, 380
põe fim às aflições
quando brilho de uva
chega à ceia dos Deuses
e cratera na festa hederígera
enreda no sono os varões. 385
Das bocas desenfreadas ANT. 1
e da demência insolente
o fim é o infortúnio,
mas a vida quieta
e o pensar bem 390
resistem intrépidos
e mantém o lar. Longe,
porém, habitando o céu
celestes veem os mortais.
O hábil não é sábio, 395
nem ter-se por imortal.
Breve a vida, por isso
quem ávido de grandezas
não colheria o presente?
Tais são modos de loucos 400
e, a meu ver, de malévolos.
Fosse eu a Chipre, EST. 2
a ilha de Afrodite,
onde moram os Amores
encantadores de mortais 405
em Pafo que as águas
de cem bocas
do rio bárbaro
fertilizam sem chuva,
e onde é a belíssima
Piéria sede de Musas, 410
solene aclive do Olimpo!
Lá me leva, ó Brômio, Brômio,
Baco-Guia, évio Nume,
lá as Graças, lá o Anseio, lá é lei 415
os rituais das Bacas.
O Nume filho de Zeus ANT. 2
alegra-se com festas,
ama a Paz magnificente
Deusa nutriz de jovens, 420
por igual deu fruir
indolor prazer do vinho
ao próspero e ao pobre,
e odeia quem descuida
de viver bem a vida 425
à luz e à noite amiga
e de manter a mente sábia
longe de gente soberba.
O que vulgo pensa e pratica, 430
isso eu aprovaria.
[SEGUNDO EPISÓDIO (434-518)]
CORO:
Ó filha do rio Aqueloo EST.
Dona Dirce de belas virgens, 520
tu em tuas águas um dia
recebeste o filho de Zeus,
ao tirá-lo do fogo imortal
na coxa Zeus Pai a gritar: 525
“Vem, Ditirambo, vem
“ao meu ventre viril!
“Revelo-te, ó Báquio,
“a Tebas com este nome.”
Tu, ó venturosa Dirce, 530
repeles meus coroados
tíasos ao tê-los em ti?
Tu me negas? Tu me banes?
Sim, pela cacheada graça
da videira de Dioniso, 535
ainda cuidarás de Brômio!
Quanta, quanta fúria ANT.
revela o térreo ser
nascido de serpente
Penteu, que o térreo 540
Equíon plantou, rude
monstro, não um mortal,
cruel qual gigante contra Deuses;
logo nos laços ele me atará 545
serva de Brômio
e já dentro da casa
tem meu guia-tíaso
sob sombrio cárcere.
Dioniso, filho de Zeus, 550
vês que teus intérpretes
lutam contra coerção?
Vem, ó rei que vibras
áureo tirso no Olimpo!
Detém cruel transgressor! 555
Onde em Nisa nutriz EPODO
de feras portas o tirso
em tíasos, ó Dioniso?
Ou nos cimos corícios?
Talvez nos sítios nemorosos 560
do Olimpo, onde Orfeu com a cítara
reuniu árvores com as Musas,
reuniu as feras silvestres.
Ó venturosa Piéria, 565
venera-te Évio e virá
com os coros e as baqueias,
transposto o veloz
rio Áxio conduzirá
as loucas rodopiantes, 570
transposto o Lídias pai doador
de felicidades aos mortais
e de quem dizem nutrir a terra
de bons corcéis com belíssimas águas! 575
[TERCEIRO EPISÓDIO (576-861)]
DIONISO:
Ió,
ouvi-me, ouvi-me a voz,
iò Bacas, iò Bacas!
CORO:
Quem? Que clamor de Évio
me conclamou? Donde?
DIONISO:
Iò ió digo de novo, 580
filho de Sêmele e Zeus.
CORO:
Iò ió! Senhor, Senhor,
vem ao nosso tíaso,
ó Brômio, Brômio!
DIONISO:
Tremor rei, treme térreo chão! 585
CORO:
 â
o palácio de Penteu
logo abalará em queda.
Dioniso lá no palácio,
venerai-o. – Veneramos, ó! 590
– Vedes nas colunas pétrea
arquitrave instável? Brômio
alarideia dentro do palácio.
DIONISO:
Acende fúlgido clarão do raio!
Arde, arde, palácio de Penteu! 595
CORO:
 â
não vês o fogo? Perto do sacro
sepulcro de Sêmele, não refulge
a chama que deixou, fulminada
pelo trovão de Zeus?
Prostrai ao chão, prostrai trêmulos 600
corpos, ó loucas,
pois revirando o palácio
vem o rei filho de Zeus.
DIONISO:
Mulheres bárbaras tão aturdidas de pavor
jazeis no chão? Parece percebestes Báquio 605
abalar o palácio de Penteu, mas erguei-vos!
Tende coragem, expulsai o tremor do corpo!
CORO:
Ó luz máxima de nossas évias baqueias,
com que júbilo te vi, a sós na solidão!
DIONISO:
Chegastes ao desânimo, sendo eu levado 610
para cair no sombrio cárcere de Penteu?
CORO:
Como não? Que defesa eu teria sem ti?
Mas como te livraste daquele varão ímpio?
DIONISO:
Salvei-me a mim mesmo fácil sem esforço.
CORO:
Não te atou as mãos com laços de cordas? 615
DIONISO:
Ainda o ultrajei, pois crendo me prender
não tocou nem atou, mas pastou esperanças.
Viu touro no estábulo onde me levou preso
e lançava-lhe laços nos joelhos e nos cascos,
resfolegando furor, pingando suor do corpo 620
e mordendo os lábios. Perto, eu, presente,
sentado quieto olhava. O Baco, entretanto,
veio, sacudiu a casa, e no sepulcro da mãe
acendeu fogo. Ao ver, crendo a casa arder,
ele pulava lá e cá, e dizia a servos trazerem 625
Aqueloo, e todo servo corria, em faina vã.
Deixando essa fadiga, como se eu fugira,
saca faca negra e precipita-se para a casa.
E Brômio, então, como me parece, opino,
fez uma visão no pátio, e ele, atacando-a, 630
pulava e picava o ar, como se me matasse.
Além disso, Báquio lhe faz outros danos:
o palácio ruiu por terra, todo escombros,
amarga lhe foi minha prisão. Sob o golpe,
solta a faca e desiste, varão contra Deus 635
ousou ir à peleja. Retirando-me quieto,
vim diante da casa, sem recear Penteu.
Ao que parece, rangem botas em casa,
logo virá ao vestíbulo. Que dirá disso?
Terei paciência, ainda que bufe muito. 640
É próprio do sábio sábia benevolência.
PENTEU:
Terrível dor! Escapou-me o forasteiro,
que há pouco estava coagido à prisão.
Éa éa,
ei-lo aqui! Que é isso? Como defronte 645
de minha casa te mostras após evasão?
DIONISO:
Detém o pé! Impõe à cólera quieto pé!
PENTEU:
Como escapaste à prisão e saíste fora?
DIONISO:
Disse que seria solto, ou não ouviste?
PENTEU:
Quem? Alegas razões sempre novas. 650
DIONISO:
Ele frutifica as vinhas para os mortais.
PENTEU: [KOVACS]
Fizeste aí bela reprimenda a Dioniso.
DIONISO: [KOVACS]
Veio aqui a esta urbe cheio de bens. [KOVACS]
PENTEU:
Ordeno fechar toda a torre ao redor!
DIONISO:
Por quê? Os Deuses não saltam muros?
PENTEU:
Sábio, sábio, tu! Não em que deves ser! 655
DIONISO:
No que mais devo ser, nisso nasci sábio.
Ouve primeiro aquele lá e toma ciência,
ele veio do monte para te anunciar algo.
Nós esperaremos por ti, não fugiremos.
MENSAGEIRO:
Ó Penteu, o senhor deste solo tebano, 660
venho do monte Citéron, onde nunca
cessa fúlgida queda de brilhante neve.
PENTEU:
Vens com que empenho de palavra?
MENSAGEIRO:
Vi Bacas veneráveis que desta terra
aguilhoadas dispararam a alva perna, 665
venho para dizer a ti e à urbe, ó rei,
que agem terríveis além do espanto.
Quero ouvir se te devo contar tudo
aquilo lá, ou se devo coibir a palavra.
Temo tua rapidez de espírito, ó rei, 670
o ímpeto súbito e a maior majestade!
PENTEU:
Diz, pois terás de mim todo indulto,
Não se deve enfurecer com o justo.
Quanto mais digas terríveis Bacas,
tanto mais levarei à justiça aquele 675
que ofereceu as artes às mulheres!
MENSAGEIRO:
Gregário rebanho de reses na penha
há pouco remontava ao topo quando
o Sol expede raios aquecendo o solo
e vejo três tíasos de femininos coros, 680
Autônoe regia o primeiro, e tua mãe
Agave o segundo, e Ino o terceiro.
Todas dormiam, largados os corpos,
umas, encostadas em crina de abeto,
outras, cabeças em folhas de carvalho 685
ao léu no chão, castas, não quais dizes,
ébrias por cratera e por som de flauta
isoladas no bosque à caça de Cípris.
Tua mãe alarideou, erguida no meio
das Bacas, que se movessem do sono, 690
por ouvir mugidos de cornígero gado.
Elas baniram dos olhos o forte sono,
saltaram retas, em admirável ordem,
jovens, velhas e virgens ainda inuptas.
Primeiro soltaram cabelos aos ombros, 695
reataram as peles de corça cujos nós
se soltaram e cingiram peles pedreses
com serpentes que lambiam as faces.
Outras com cabrito ou filhotes bravios
de lobas nos braços davam alvo leite, 700
mães recentes ainda com seios túrgidos,
deixando os filhos. Elas se coroaram
de hera, carvalho e florífera briônia.
Uma delas com o tirso bateu na pedra,
donde promana úmido fluxo de água; 705
outra lançou a férula ao solo da terra
e o Deus aí desatou a fonte de vinho.
Quantas desejassem da alva poção,
ao arranharem com os dedos o solo,
tinham jatos de leite, e dos hederosos 710
tirsos gotejavam pingos de mel doces.
Assim, se presente visses isso, farias
preces ao Deus que agora invectivas.
Vaqueiros e pastores nos reunimos
em recíproca rixa de falas comuns, 715
por serem atos terríveis admiráveis.
Um vadio da cidade treinado em falar
disse a todos: “Ó vós dos veneráveis
“cimos dos montes, quereis cacemos
“nas baqueias Agave mãe de Penteu 720
“e façamos favor ao rei?” Pareceu-nos
falar bem, e ocultos em tufos de mato
deitamo-nos à espreita. À hora ritual
elas sacudiam tirsos a fim da baqueia,
uníssonas clamando Íaco Brômio filho 725
de Zeus, e tudo se fazia Baco: monte
e feras, e nada era imóvel na corrida.
Passa Agave correndo perto de mim,
e dei um salto, querendo capturá-la,
deixando a moita onde me ocultava. 730
Ela gritou: “Minhas velozes cadelas,
“caçam-nos estes varões! Segui-me!
“Segui com mãos armadas de tirsos!”
Nós, pondo-nos em fuga, escapamos
à laceração das Bacas, que atacaram 735
com mãos sem ferro reses no pasto.
Uma tu verias arrastar com as mãos
gemente novilha de úberes cheios,
outras destroçar novilhas laceradas.
Verias as costelas e bífidos cascos 740
arremessados a esmo, e suspensos
em abetos pingar sangue disperso.
Touros, brutais de furiosos chifres
antes, estatelavam o corpo no chão
levados por mil mãos de donzelas. 745
Mais rápido destroçavam as carnes
que dás pálpebras às régias pupilas.
Vão quais aves suspensas em voo
nos campos que junto ao rio Asopo
produzem frutífera espiga a tebanos, 750
atacando Hísias e Éritras, povoados
no sopé do monte Citéron, viraram
tudo de alto a baixo como inimigas;
arrebataram as crianças das casas,
o que sem atar puseram aos ombros 755
mantinha-se e não caía no chão negro,
nem bronze, nem ferro, e nos cabelos
tinham fogo e não ardia. Eles, irados,
corriam às armas, pilhados por Bacas.
Aí o portento era espetáculo, ó rei! 760
Nem dardo pontiagudo nem bronze
nem ferro sangrava a pele possessa, 757a [KOVACS]
mas elas jorrando os tirsos das mãos
feriam e faziam dar as costas em fuga
mulheres a varões, não sem um Deus.
Outra vez foram para donde partiram, 765
às fontes mesmas que Deus lhes deu,
lavaram o sangue, as gotas das faces
serpes limparam da pele com a língua.
A este Nume, pois, quem seja, ó rei,
recebe nesta urbe! Que ele é grande 770
noutras e nisto o dizem, o que ouvi,
deu a dolorífuga vinha aos mortais.
Se vinho não há mais, não há Cípris
nem outro prazer dos mortais ainda!
CORO:
Receio sim dizer as palavras livres 775
ao soberano, mas há de se dizer:
Dioniso é menor que nenhum Deus!
PENTEU:
Já aqui perto se alastra como fogo
ultraje de Bacas, injúria aos gregos!
Mas, sem tardar, vai à porta Electra, 780
ordena virem todos os escudeiros
e os montados em velozes cavalos,
e quantos vibram peltas e tangem
cordas de arcos, para combatermos
Bacas! Não, mas isto é um ultraje, 785
sofrer de mulheres o que sofremos!
DIONISO:
Não atendes ao ouvir a minha fala,
Penteu! Maltratado por ti, porém, digo
que não deves erguer arma contra Deus,
mas ficar quieto. Não permitirá Brômio 790
que removas Bacas dos évios montes.
PENTEU:
Não me instruas, mas preso em fuga
preserves isso, ou te reaplico justiça.
DIONISO:
Sacrifícios sim, mas não coices furiosos
contra aguilhão eu mortal daria ao Deus. 795
PENTEU:
Sacrificarei sangue fêmeo por mérito,
perturbando muito o vale do Citéron.
DIONISO:
Fugireis todos e eis o vexame: Bacas
repelir com tirsos escudos de bronze.
PENTEU:
Eis-nos atados a impossível forasteiro 800
que nem batido nem batendo se cala.
DIONISO:
Ó meu caro, isso ainda tem conserto.
PENTEU:
Fazendo o quê? Servindo às servas?
DIONISO:
Eu trarei as mulheres aqui sem armas.
PENTEU:
Oímoi! Ele já me trama esse dolo! 805
DIONISO:
Qual, se te quero salvar com arte?
PENTEU:
Pactuastes juntos ser Bacos sempre.
DIONISO:
Sim, isso pactuei, sabe, com o Deus.
PENTEU:
Trazei-me as armas aqui, e tu cala-te!
DIONISO:
Â! 810
Queres vê-las reunidas na montanha?
PENTEU:
Muito! Daria dez mil pesos de ouro!
DIONISO:
O quê! Caíste em grande amor disso!
PENTEU:
Com tristeza eu as veria, se ébrias.
DIONISO:
Mas verias com prazer o que te dói? 815
PENTEU:
Bem sabe, silente sentado sob abetos.
DIONISO:
Mas te rastrearão, ainda que oculto.
PENTEU:
Mas às claras, pois bem o disseste!
DIONISO:
Devemos te guiar e farás a viagem?
PENTEU:
Guia o mais rápido! Tempo te nego. 820
DIONISO:
Veste o corpo com túnica de bisso!
PENTEU:
Que é isso? De varão viro mulher?
DIONISO:
Não te matem, se te virem varão lá.
PENTEU:
Bem o disseste! Que antigo sábio és!
DIONISO:
Dioniso nisto foi a nossa inspiração. 825
PENTEU:
Como seria o que tu me alertas bem?
DIONISO:
Em casa, eu prepararei as tuas vestes.
PENTEU:
Vestes? de mulher? Pudor me impede!
DIONISO:
Não tens mais ânimo de ver as loucas?
PENTEU:
Que vestes dizes que porás em mim? 830
DIONISO:
Porei longa cabeleira em tua cabeça.
PENTEU:
Qual a outra figura de meu adorno?
DIONISO:
Túnicas talares, e mitra na cabeça.
PENTEU:
Que mais acrescentarás além disso?
DIONISO:
Tirso na mão, e pele vária de corça. 835
PENTEU:
Eu não poderia vestir roupa feminina.
DIONISO:
Mas farás sangue com guerra a Bacas.
PENTEU:
Correto, devo ir primeiro à inspeção.
DIONISO:
É melhor que caçar males com males.
PENTEU:
E como passarei oculto aos cadmeus? 840
DIONISO:
Iremos por vias ermas, serei teu guia.
PENTEU:
Tudo vale, não rindo de mim Bacas!
DIONISO:
Em casa, preparemos o que é preciso! 843a [KOVACS]
PENTEU:
Espera! Eu deliberarei o que decidir. 843b [KOVACS]
DIONISO:
Pode ser, estou disponível para tudo.
PENTEU:
Eu iria, pois ou marcharei com armas 845
ou serei persuadido de teus conselhos.
DIONISO:
Mulheres, o varão se vai para a rede, 848
irá a Bacas, onde morto será punido. 847
Dioniso, age agora! Não estás longe.
Punamo-lo! Primeiro lhe tira o siso 850
com leve delírio, porque se prudente
não quererá vestir roupa de mulher,
mas, impelido fora de siso, vestirá.
Quero expô-lo ao riso dos tebanos
ao ir vestido de mulher pela cidade 855
por ameaças em que antes era hábil.
Mas irei e porei em Penteu o adorno
com que morto por mãos da mãe irá
a Hades, e conhecerá o filho de Zeus
Dioniso manifesto aos homens Deus 860
o mais terrível e o mais benevolente.
[TERCEIRO ESTÁSIMO (862-911)]
CORO:
Ah, nos coros noturnos EST.
porei o brilhante pé
na dança de Baco, lançando
garganta ao céu orvalhado? 865
Como corça a brincar nos
verdes prazeres do prado
quando escapa à pavorosa
caçada, livre da matilha,
além das bem urdidas redes, 870
e o caçador a açular
se vai na corrida dos cães?
Ela no afã do curso veloz
de procela corre a planície
à beira do rio, jubilosa
longe de mortais entre brotos 875
da sombria floresta frondosa.
Que é hábil? Qual mais belo
prêmio dos Deuses aos mortais
do que ter o braço mais forte
sobre a cabeça dos inimigos? 880
O que é belo é sempre nosso.
Move-se a custo, mas ANT.
confiável a força
divina: acerta mortais
que honram ignorância 885
e não louvam Deuses
por louca opinião.
Oculta com astúcia
o longo pé do tempo
e dá caça ao ímpio. 890
Não acima das leis
cabe saber e fazer.
Custa pouco pensar
que força tem isto:
o que for numinoso,
a lei de longo tempo 895
e o sempre manifesto.
Que é hábil? Qual mais belo
prêmio dos Deuses aos mortais
do que ter o braço mais forte
sobre a cabeça dos inimigos? 900
O que é belo é sempre nosso.
Tem bom Nume quem escapa EPODO
à tormenta do mar até o porto.
Tem bom Nume quem vence
males: cada vez um ao outro 905
supera em poder e fausto.
Muitos varões ainda têm
muitas esperanças: umas
com fausto se cumprem
aos mortais, outras, não. 910
Quem cada dia tem vida
com bom Nume, felicito.
[QUARTO EPISÓDIO (912-976)]
DIONISO:
Tu, que anseias ver o que não deves,
e te prestas ao imprestável, Penteu,
vem para a frente da casa! Aparece-me
com os trajes de mulher louca Baca, 915
espião visado da tua mãe e da tropa!
Tens forma de uma filha de Cadmo.
PENTEU:
Parece-me, sim, que vejo dois sóis
e duas Tebas, cidadela de sete portas,
e parece que touro nos guias à frente, 920
e que chifres surgiram em teu crânio.
Mas tu afinal eras fera? Pois és touro!
DIONISO:
O Deus vem junto, antes não benévolo,
aliou-se a nós, agora vês o que deves.
PENTEU:
Que te pareço? Ter o porte de Ino? 925
Ou ter o porte de minha mãe Agave?
DIONISO:
Creio que as vejo, quando te vejo.
Mas tens este cabelo fora do lugar,
não como eu o arranjei sob a mitra.
PENTEU:
Em casa lançando-o adiante e atrás 930
dançando a Baco eu o tirei do lugar.
DIONISO:
Mas nós incumbidos de te servir
refaremos isso. Ergue a cabeça!
PENTEU:
Eis, adorna! A ti nos entregamos.
DIONISO:
Teu cinto se solta e a série de dobras 935
da túnica não vai até teus tornozelos.
PENTEU:
Assim me parece junto ao pé direito.
Deste lado junto ao tendão está reta.
DIONISO:
Talvez me julgues teu maior amigo
ao vires não esperadas castas Bacas. 940
PENTEU:
Com o tirso na mão direita ou nesta
eu ficarei mais parecido com Baca?
DIONISO:
Na destra deves erguê-lo e o pé direito
simultâneo. Louvo tua mudança de ânimo.
PENTEU:
Ah, eu poderia trazer o vale do Citéron 945
com as Bacas mesmas nos meus ombros?
DIONISO:
Poderias, se quisesses. Antes não tinhas
ânimo são, agora o tens qual deves ter.
PENTEU:
Levemos alavancas, ou passo o braço
ou ombro sob picos e ponho nas mãos? 950
DIONISO:
Não deves destruir templos de Ninfas
nem santuários de Pã onde toca flauta.
PENTEU:
Bem disseste! Não se vençam mulheres
pela força. Eu me ocultarei nos abetos.
DIONISO:
Ocultarás ocultação que deves ocultar 955
ao ires doloso espião visado de Loucas.
PENTEU:
Sim, penso que quais aves no ninho
estão elas em seus enlaces do leito.
DIONISO:
Não te vais por isso mesmo vigilante?
Talvez as pegues se não te pegam antes. 960
PENTEU:
Leva-me pelo meio da terra tebana,
sou deles o único varão a ousar isto.
DIONISO:
Único sofres tu por esta urbe, único.
Combates te esperam quais deviam.
Mas segue, sou eu guia salvador, 965
de lá outro te levará...
PENTEU:
Minha mãe.
DIONISO:
Serás sinal a todos.
PENTEU:
Por isso vou.
DIONISO:
Trazido virás...
PENTEU:
Dizes-me delícia.
DIONISO:
Nas mãos da mãe.
PENTEU:
A mimos me obrigas.
DIONISO:
Tais mimos sim.
PENTEU:
Méritos me cabem. 970
DIONISO:
Terrível tu terrível vais a terríveis dores,
tais que descobrirás glória a tocar o céu.
Estende as mãos, Agave, e vós, irmãs
filhas de Cadmo! Conduzo este moço
ao grande combate, o vencedor serei 975
e Brômio será, o restante o mostrará.
[QUARTO ESTÁSIMO (977-1023)]
CORO:
Ide, ágeis cadelas de Fúria, ao monte EST.
onde as filhas de Cadmo têm o tíaso!
Ide, instigai-as
contra quem se veste de mulher 980
furioso espião visado de loucas!
A mãe, primeiro, de pedra lisa
ou de pináculo o verá
espreitar e dirá às loucas:
“Quem à caça de montívagas cadmeias 985
“ao monte, ao monte veio, veio, ó Bacas?
“Ah, quem o pariu?
“Ele não nasceu do sangue
“de mulheres, mas de leoa 990
“ou filho de Górgonas líbias!”
Vá Justiça visível,
vá com faca matar
através da garganta
o sem Deus nem lei nem justiça 995
rebento terrígeno de Equíon.
Com injusto intento e insólita ira ANT.
a rituais teus e de tua mãe, ó Baco, [KOVACS]
ele com ânimo louco
e aturdido senso investe 1000
para vencer à força o invencível.
Morte implacável torna o intento
cauto com os Deuses
e ter-se mortal dá viver sem dor.
Não invejo o hábil, praz-me 1005
caçar outros relevos visíveis
sempre do belo na vida,
para dia e noite venerar
reverente e repelindo leis
injustas honrar os Deuses. 1010
Vá Justiça visível,
vá com a faca matar
através da garganta
o sem Deus nem lei nem justiça 1015
rebento terrígeno de Equíon.
Mostra-te touro ou visível EPODO
serpente de muitas cabeças
ou leão rutilante! Ide, ó Baco,
feroz ao caçador de Bacas! 1020
Lança com rosto risonho
rede mortífera nesse caído
sob o rebanho de loucas!
[QUINTO EPISÓDIO (1024-1152)]
MENSAGEIRO:
Ó casa, antes com boa sorte na Grécia,
do ancião sidônio que na terra semeou 1025
a messe terrígena da víbora serpente,
como te lamento, sendo servo! Porém
servos honestos têm a sorte dos donos.
CORO:
Que é? Trazes uma notícia das Bacas?
MENSAGEIRO:
Morreu Penteu, o filho de pai Equíon. 1030
CORO:
Ó rei Brômio, grande Deus te mostras!
MENSAGEIRO:
Que dizes? Que disseste? Alegras-te
se meus donos se dão mal, ó mulher?
CORO:
Celebro Évio forasteira em voz bárbara.
Não me curvo mais de medo de cadeia. 1035
MENSAGEIRO:
Consideras Tebas tão sem varões?
CORO:
Dioniso, Dioniso, não Tebas,
tem poder sobre mim.
MENSAGEIRO:
Pode-se perdoar-te, mas alegrar-se
com males não é belo, ó mulheres! 1040
CORO:
Diz-me! Fala! De que morte morre
varão injusto provedor de injustiça?
MENSAGEIRO:
Deixando as casas da terra tebana
e passando pelas águas do Asopo,
alcançamos as alturas do Citéron 1045
Penteu e eu, pois eu seguia o dono,
e o forasteiro, nosso guia de viagem.
Primeiro sentamos no vale relvoso
conservando o silêncio dos passos
e voz para vermos sem ser vistos. 1050
Era vale cercado, provido de água,
à sombra de pinhos, onde as loucas
sentadas têm mãos em doces fainas.
Umas delas coroavam tirso extinto
de novo com a cabeleira de heras, 1055
outras alternavam melodia báquica,
quais potras soltas de jugos vários.
Pobre Penteu, sem ver turba fêmea,
disse: “Ó forasteiro, onde estamos
“não avistamos mazelas de loucas! 1060
“Sobre abeto frondoso das escarpas
“talvez bem visse vilezas de loucas.”
Aí já vejo os milagres do forasteiro:
pegando ramo de abeto alto no céu
trouxe, trouxe, trouxe ao chão negro 1065
e curva-o tal qual arco ou curva roda
traçando em torno curvilíneo círculo,
assim o forasteiro dobrou nas mãos
o talo montês à terra, feito imortal.
Instalou Penteu no ramo de abeto 1070
e solta das mãos o galho reto acima
sem abalo para que não derrubasse
e reto se firmou no firmamento reto
mantendo o dono montado no dorso.
Mas foi visto antes de ver as loucas. 1075
Ainda não era visível sentado no alto
e já não se avistava mais o forasteiro
e uma voz no firmamento, Dioniso,
ao que parece, retumbou: “Ó moças,
“trago-vos quem ria de vós, de mim 1080
“e de meus rituais! Vingai-vos nele!”
Ele assim falava e no céu e na terra
expandia-se a luz de venerando fogo.
Silente o céu, silente o vale silvestre
frondoso, não se ouvia grito de feras. 1085
Elas, sem terem ouvido claro o som,
pararam eretas e moveram as pupilas.
Ele clamou outra vez: reconhecendo
claro clamor de Báquio as cadmeias
pularam com pés na corrida intensa 1090
não menos velozes do que pombas,
a mãe Agave e as congêneres irmãs
e todas as Bacas, e loucas saltavam
vale hiemal e picos ao sopro de Deus.
Ao virem meu dono montado no abeto, 1095
primeiro lhe lançaram seixos violentos
pisando sobre pedra como numa torre,
e dardejavam com os ramos de abeto,
outras lançavam tirsos ao firmamento,
a Penteu, mísero alvo, mas sem acertar. 1100
Em altura superior à força do impulso
estava o mísero, entregue ao impasse.
Por fim cavando com ramos de carvalho,
arrancaram raízes com estacas sem ferro.
Por não concluírem o término das fainas, 1105
disse Agave: “Vinde! Circundai ao redor,
“pegai o tronco, ó loucas, que prendamos
“a fera empoleirada e não delate divinos
“coros secretos!” Elas puseram milhares
de mãos no abeto e arrancaram do chão. 1110
Sentado no alto, lançado do alto ao solo,
caiu por terra com milhares de gemidos
Penteu, pois já perto do mal aprendia.
Primeiro a mãe sacerdota inicia matança
e ataca-o, ele retira a mitra da cabeleira 1115
para que Agave mísera o reconhecesse
e não matasse, e ele tocando-lhe a face
diz: “Sou eu, mãe, olha, sou o teu filho
“Penteu, que pariste na casa de Equíon.
“Apieda-te de mim, ó mãe, e por meus 1120
“desacertos, não massacres o teu filho!”
Ela, soltando espuma e girando pupilas
viradas, sem pensar o que devia pensar,
era possessa de Báquio. Não persuadiu.
Tomando nas mãos o braço esquerdo 1125
e pisando os flancos do de mau Nume,
arrancou a espádua, não por ter força,
mas o Deus dava facilidade às mãos.
Ino por outro lado completava o ato
rasgando carnes, Autônoe e a turba 1130
de Bacas toda atacava, uníssona grita,
ele a gemer tanto quanto tinha fôlego,
elas a aclamar. Uma trazia um braço,
outra o pé na bota, e flancos lacerados
se desnudavam, e as mãos sangrentas 1135
jogavam bola com a carne de Penteu.
Jaz disperso o corpo, ora em abruptas
pedras, ora na densa crina silvestre,
não fácil de achar. A cabeça é prêmio
que a mãe por acaso recebe nas mãos, 1140
finca na ponta do tirso como a de leão
montês e transporta em meio a Citéron,
deixando as irmãs nos coros de loucas.
Adianta-se, alardeando infausta caçada,
dentro destes muros, invocando Báquio 1145
o parceiro de caça, o coautor da captura,
o belo vencedor. Sua vitória trará pranto.
Eu, pois, desembaraçado desta situação,
partirei antes de Agave chegar em casa.
A prudência e a veneração dos Deuses 1150
é o melhor, e creio que é a mais sábia
aquisição para os mortais ter em uso.
[QUINTO ESTÁSIMO (1153-1164)]
CORO:
Dancemos exaltando Báquio,
gritemos exaltando a sorte
de Penteu filho de serpente, 1155
ele vestiu trajes de mulher
e teve por belo tirso
o fiel báculo de Hades,
com o touro a guiar a sorte.
Bacas cadmeias, ínclita 1160
bela vitória conquistastes
para gemidos e prantos.
Belo combate, mão sangrenta
lançar no sangue do filho!
[ÊXODO (1165-1392)]
CORO:
Mas vejo que Agave mãe de Penteu 1165
vem para casa com os olhos tortos.
Recebei-a na festa do Deus Évio!
AGAVE:
Ásias Bacas...
CORO:
Por que me chamas? EST.
AGAVE:
Trazemos dos montes
cacho recém-cortado para casa, 1170
venturosa caçada.
CORO:
Vejo e te recebo na festa.
AGAVE:
Agarrei sem redes
este jovem filhote
como se pode ver. 1175
CORO:
Em qual ermo?
AGAVE:
Citéron...
CORO:
Citéron?
AGAVE:
... o massacrou.
CORO:
Quem golpeou?
AGAVE:
Meu o primeiro prêmio,
venturosa Agave nos gloriam nos tíasos! 1180
CORO:
Quem mais?
AGAVE:
As de Cadmo...
CORO:
De Cadmo quê?
AGAVE:
As filhas de Cadmo
após mim, após mim, tocaram a fera.
Que boa sorte nesta caçada!
Participa da festa!
CORO:
Que participo, mísera? ANT.
AGAVE:
O vitelo é jovem, sob 1185
cabeça de crina macia
queixo agora floresce.
CORO:
Crina brilha qual fera agreste.
AGAVE:
O Báquio caçador
sábio sabiamente atiçou 1190
as loucas a esta fera.
CORO:
Pois o rei é predador!
AGAVE:
Louvas?
CORO:
Louvo.
AGAVE:
Logo os cadmeus...
CORO:
E seu filho Penteu...
AGAVE:
...louvarão a mãe 1195
por esta caçada leonina.
CORO:
Magnífica.
AGAVE:
Magnificamente.
CORO:
Celebras?
AGAVE:
Jubilosa!
Grandes, grandes feitos
manifestos nesta caçada!
CORO:
Ó audaz, mostra aos cidadãos 1200
a vitoriosa caça que trouxeste!
AGAVE:
Ó habitantes da cidade de belas torres
da terra tebana, vinde, vede esta caça
fera que nós, filhas de Cadmo, caçamos,
nem com encordoados dardos tessálios, 1205
nem com redes, mas com as pontas
das mãos de alvos braços. Convém
dardejar e de artesãos ter lanças vãs?
Nós com as mãos mesmas pegamos
e despedaçamos as junções da fera. 1210
Onde está o velho pai? Venha perto!
Penteu meu filho onde está? Pegue
e erga em casa graus de escada sólida
para pregar nos tríglifos esta cabeça
do leão que cacei e eis-me presente. 1215
CADMO:
Segui-me, portadores do mísero peso
de Penteu, segui, servos, diante de casa,
onde com mil buscas de fadigas porto
o corpo, encontrado no vale do Citéron,
disperso, não colhido no mesmo lugar, 1220
difícil de descobrir jacente no bosque.
Ouvi de alguém as ousadias das filhas,
já quando dentro dos muros da cidade,
com o velho Tirésias, vindo das Bacas.
Tendo retornado ao monte, transporto 1225
o filho que foi massacrado por loucas.
Vi aquela que outrora gerou Actéon
para Aristeu, Autónoe e, junto, Ino,
entre carvalhos míseras aguilhoadas.
Disseram-me que para cá veio Agave 1230
com pé báquico e não ouvimos inépcia,
pois vejo-a, visão não de bom Nume.
AGAVE:
Pai, tu podes fazer o máximo alarde,
por semear as filhas muito melhores
dos mortais, todas e, máxime, a mim 1235
que deixei a lançadeira junto ao tear
e faço mais, caçar feras com as mãos.
Peguei e porto nos braços, como vês,
este galardão, para que se dependure
em casa. Ó pai, toma-o tu nos braços, 1240
e com todo o orgulho de minha caça,
convida os amigos à festa! Venturoso,
venturoso és tu, tais as nossas proezas.
CADMO:
Ó dor imensa e impossível de ver,
morte em míseras mãos, tais proezas! 1245
Por abateres bela vítima aos Numes,
convidas Tebas e a mim para festa!
Oímoi, por teus e por meus males!
Com justiça, mas excessiva, o Deus
Brômio rei, o de casa, nos destruiu. 1250
AGAVE:
Que intratável é a velhice aos mortais
e sombria aos olhos! Fosse meu filho
bom caçador, símil à mãe nos modos,
quando junto com os moços tebanos
caçasse feras! Mas só combater Deus 1255
ele sabe! Ó pai, teu dever é adverti-lo!
Quem o chamaria aqui à minha vista,
para que me visse, a de bom Nume?
CADMO:
Pheû! Pheû! Cientes do que fizestes,
tereis terrível dor. Se permanecerdes 1260
sempre completamente como estais,
sem boa sorte pensareis não ter má.
AGAVE:
O que aqui não está bem? Que dói?
CADMO:
Primeiro, lança o olhar para o céu!
AGAVE:
Eis! Por que me sugeriste que olhe? 1265
CADMO:
Ainda te parece o mesmo ou outro?
AGAVE:
Brilha mais que antes e mais límpido.
CADMO:
Ainda tens o aturdimento da mente?
AGAVE:
Não sei que dizes, torno-me lúcida
por mudança do espírito anterior. 1270
CADMO:
Ouvirias e responderias algo claro?
AGAVE:
Esqueci o que antes dissemos, pai!
CADMO:
A que casa foste após o himeneu?
AGAVE:
Deste-me a Equíon, dito semeado.
CADMO:
Que filho em casa deste ao esposo? 1275
AGAVE:
Penteu, por união minha e do pai.
CADMO:
Tens nas mãos esse rosto: de quem?
AGAVE:
De leão, assim diziam as caçadoras.
CADMO:
Olha direito! Custa pouco observar.
AGAVE:
Ea! Que vejo? Que tenho nas mãos? 1280
CADMO:
Examina e aprende mais claramente!
AGAVE:
Vejo a máxima dor, mísera de mim!
CADMO:
Será que te parece semelhante a leão?
AGAVE:
Não! Mísera tenho o rosto de Penteu!
CADMO:
Pranteado antes que o reconhecesses. 1285
AGAVE:
Quem o matou? Como me veio às mãos?
CADMO:
Triste verdade, que não vieste a tempo!
AGAVE:
Diz! Meu coração está sobressaltado.
CADMO:
És tu quem o matou, tu e tuas irmãs.
AGAVE:
Onde morreu? Em casa? Em que sítio? 1290
CADMO:
Onde antes cães dilaceraram Actéon.
AGAVE:
Por que de mau Nume foi ao Citéron?
CADMO:
Indo escarnecia Deus e tuas baqueias.
AGAVE:
Como fomos parar lá naquele lugar?
CADMO:
Fostes loucas e toda a urbe debacou. 1295
AGAVE:
Dioniso nos destruiu, já compreendo.
CADMO:
Ultrajado. Deus não o consideráveis.
AGAVE:
Onde meu caro corpo do filho, pai?
CADMO:
Eu a custo o encontrei e transporto.
AGAVE:
Está todo bem juntado nas junções? 1300
< >
< >
< >
AGAVE:
Que teve Penteu de minha demência?
CADMO:
Era símil a vós por não venerar Deus.
Por isso atou a todos em um só dano,
a vós e a ele, de modo a destruir a casa
e a mim, que privado de filhos varões 1305
vejo este filho de teu ventre, ó mísera,
morrer do modo mais reles e mais vil.
Ó filho, foste a luz da casa, mantinhas
meu palácio, filho nato de minha filha,
na urbe eras temido: ninguém queria 1310
ultrajar o velho, ao avistar o teu vulto,
porque dignamente tomavas a justiça.
Agora sem honra serei banido da casa,
o grande Cadmo, que semeei a estirpe
dos tebanos e colhi a mais bela messe. 1315
Ó meu caro (ainda que não mais vivo,
serás contado entre os meus caros) filho,
não mais tocando esta barba com a mão,
chamando “pai da mãe”, abraçarás, filho,
dizendo: “Que injusto te desonra, velho? 1320
“Quem aborrece e perturba teu coração
“Diz, para eu punir quem injusto, ó pai.”
Agora mísero sou eu, miseranda és tu,
a mãe na miséria, e miserandas irmãs.
Se há quem se creia acima dos Numes, 1325
veja a morte dele e respeite os Deuses!
CORO:
Sinto por ti, Cadmo! O filho de tua filha
tem justiça digna, mas dolorosa para ti.
AGAVE:
Ó pai, vês que mudança em minha vida?
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DIONISO:
< >
< >
Serpente serás por mudança e tua esposa 1330
mudada em fera terá a forma de víbora.
Tu mortal obtiveste Harmonia de Ares.
Como diz oráculo de Zeus, conduzirás
com ela carro de bois, guiando bárbaros,
e com inúmera tropa devastarás muitas 1335
urbes, e quando destruírem o santuário
de Lóxias, suportarão acerbo retorno,
e Ares te defenderá, a ti e a Harmonia,
e porá tua vida na terra dos venturosos.
Eu, Dioniso, o digo, não de pai mortal 1340
nascido, mas de Zeus. Se vós tivésseis
prudência, quando não queríeis, teríeis
bom Nume com o aliado filho de Zeus.
CADMO:
Dioniso, suplicamos-te, fomos injustos!
DIONISO:
Tarde nos vedes, não víeis quando devíeis. 1345
CADMO:
Reconhecemos, mas teu ataque é violento.
DIONISO:
Deus nato fui ultrajado também por vós.
CADMO:
Ira não deve semelhar Deuses a mortais.
DIONISO:
Outrora Zeus o meu pai assim inspirou.
AGAVE:
Aiaî! Decretados tristes exílios, velho! 1350
DIONISO:
Por que ainda hesitais ante o necessário?
CADMO:
Ó filha, a que terrível mal viemos nós
todos, miseranda és tu e as tuas irmãs,
e miserando eu suplicarei aos bárbaros,
velho forasteiro, e ainda é meu vaticínio 1355
guiar tropa mista de bárbaros à Grécia.
Minha esposa Harmonia, filha de Ares,
em forma de fera serpente, eu serpente
guiarei contra altares e túmulos gregos,
levando lanças. Mísero não darei fim 1360
a meus males, nem navegarei precípite
Aqueronte nem alcançarei a quietude.
AGAVE:
Ó pai, eu afastada de ti serei banida!
CADMO:
Por que me abraças, ó mísera filha,
qual ave cisne ao grisalho zangão? 1365
AGAVE:
Para onde devo ir, expulsa da pátria?
CADMO:
Não sei, filha! Vale pouco o pai.
AGAVE:
Salve, ó palácio! Salve, ó urbe
pátria! Por má sorte, partirei,
banida de casa. 1370
CADMO:
Vai, ó filha, ao de Aristeu
< >.
AGAVE:
Lamento por ti, ó pai!
CADMO:
Ó filha,
eu pranteio por ti e tuas irmãs!
AGAVE:
Terrível esta afronta
o rei Dioniso 1375
inflige a tua casa.
CADMO:
Ele sofria de nós ultrajes terríveis
com o nome sem honra em Tebas!
AGAVE:
Salve, meu pai!
CADMO:
Salve, ó mísera
filha! Difícil te seria este salve! 1380
AGAVE:
Conduzi-me às irmãs, ó servas,
para irmos junto a triste exílio!
Possa eu ir aonde nem
Citéron impuro me veja,
nem eu aviste o Citéron, 1385
nem haja memória de tirso!
Outras Bacas dele cuidem!
CORO:
Muitas são as formas dos Numes,
muitos atos inopinados de Deuses
e as expectativas não se cumprem 1390
e dos inesperados Deus vê saída.
Assim é que aconteceu este fato.
CASA GUILHERME DE ALMEIDA
R. Macapá, 187 - Perdizes | CEP 01251-080 | São Paulo
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